Por Norttt Mendes
São três os modelos por que passaram, e passam, as administrações públicas de todo o mundo: patrimonialista, burocrática e gerencial. Frise-se que o posteriormente implantado não dizimou por completo o anterior. Assim, vê-se a coexistência dos três modelos.
O patrimonialista é
o em que o soberano é o Estado; basta lembrar a famigerada frase de
Luis XIV: “o Estado sou eu”. Não há bens públicos. Tampouco,
particulares. Todos os bens são do soberano, do Estado. Esse poder
funda-se, em regra, no Direito Divino:
o governante é uma divindade ou representante maior dela. Assim, sua
vontade é a lei, sendo inquestionável, irremediável. Governa
despoticamente. Tudo é sua propriedade, inclusive os seus súditos; sobre
esses, tem poder de vida e morte. Não existe a coisa pública.
Isso, é claro, favorece toda a sorte de desmandos. Disso, originou-se a corrupção, o nepotismo, as prebendas.
Todavia, veio a Revolução Francesa. Nascia o Capitalismo, no plano econômico; e o Liberalismo, no plano social. Liberdade, igualdade e fraternidade: eis o lema. E ele não se harmoniza de forma alguma com um estado despótico. Vem a ideia concreta de democracia,
relembrando os antigos gregos. É o povo que é dono de tudo, e não um
qualquer que se eleva ao patamar de um deus. Pelo menos, era isso que
ocorria no campo das palavras. Na prática, a democracia começou a “mexer
os pezinhos”. Hoje, ela já está “engatinhando”.
Bem,
como o povo passou a ter bens, esses passaram a ser chamados de coisa
pública. Há, aqui, uma clara separação dessa para a coisa particular. Weber sistematizou essa ideia. Criou a Burocracia.
Impessoalidade, formalismo, hierarquia funcional, meritocracia na
carreira pública, profissionalização do servidor, controles prévios,
eficiência e racionalidade. Estava feito um sistema que, em teoria,
moralizaria a administração pública e a faria executar,
satisfatoriamente, a sua função.
Mas
não foi exatamente isso o que ocorreu. O Estado estava tão preocupado
em ser eficiente e evitar a corrupção, que não fazia outra coisa. E nem
isso conseguiu, pois, além de não ser eficaz, não estava sequer sendo
eficiente. E a corrupção? E o nepotismo? E a prebenda? Não acabaram.
Continuaram existindo, embora em menor grau. Essa expressão “em menor
grau” causa estranheza. Alguns pensarão: antigamente era pior do que
hoje? Infelizmente, era bem pior. É importante destacar que o interesse
público passou a ser o mesmo que interesse do Estado. Ou seja, o soberano não era mais um “ser divino”, não era tampouco o povo: era o Estado.
O
mundo, porém, foi mudando. A técnica evoluía em escala astronômica. Os
mercados se achataram. Surgiu a classe média. A complexidade das nações
não permitia mais um Estado omisso. Veio a Primeira Guerra Mundial. Veio
a Grande Depressão. Veio a Segunda Guerra Mundial. O Estado não poderia
mais negligenciar a sua função. Surgiu então o Estado do Bem-Estar Social. Esse foi o reforço da burocracia, mas com mais ética. Deu certo por um tempo. Mas não muito.
Então, na Inglaterra, surgiu a grande ideia: é preciso que o Estado seja idêntico a uma empresa.
O mais importante não é o processo, é o resultado. Não é a eficiência
que subordina a eficácia, é a eficácia que subordina a eficiência (como
se uma pudesse existir sem a outra, mas esse é assunto para outra
ocasião). Surge o modelo gerencial de gestão, que é um filho muito amado, tratado com todo o carinho e privilégio pelo Neoliberalismo.
No Brasil, sua implantação começou com Collor, continuou com Itamar e,
na carona do Plano Real, se consolidou com FHC. Sendo efetivamente
formalizado na emenda constitucional 19, em 1998.
É importante destacar que o modelo gerencial não descarta o burocrático.
Apenas muda suas prioridades. Continuam a meritocracia, o não
nepotismo, a profissionalização, o formalismo, a impessoalidade. Surge,
porém, uma nova ideia, erigida a status de princípio constitucional: a eficiência. Mas eficiência, aqui, não tem o sentido que lhe atribui a ciência administrativa. É mais que isso. É, ao mesmo tempo,
eficiência, eficácia e efetividade. Com ela, passou a haver: maior
participação da sociedade civil organizada (publicização); redução da
inchada, lenta e ineficaz máquina estatal; estabelecimento de metas;
criação de agências reguladores; descentralização dos serviços públicos;
e, eis o mais importante, houve uma real tentativa de se implantar, no
funcionalismo público, a ideia do cliente-cidadão.
O
problema é que a humanidade não sabe o que é equilíbrio. Ela radicaliza
em tudo. Pelo menos, é o que mostra a História. O enxugamento na
máquina pública, com o objetivo de se alcançar o estado mínimo, foi
tanto, que ficou abaixo do mínimo. O cidadão ficou à mercê, como na
época do Liberalismo, das forças do mercado, que já provaram não ser
nada humanas.
Por
isso, hoje, no Brasil, desde a gestão Lula, vê-se um misto de Estado de
Bem-Estar Social com Neoliberalismo. E, pelo menos para a maioria,
parece estar dando certo.
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